Este artigo faz parte de uma série que debate em dez capítulos questões fundamentais para o avanço da educação no Brasil. As publicações acontecem em comemoração aos 10 anos de atuação do Instituto Alfa e Beto. Leia AQUI a série completa de artigos.
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A urgência da educação no país é indicativo de que falar sobre o assunto deve ser postura prioritária na sociedade. A reflexão permanente sobre como fomentar e qualificar a presença do tema no debate nacional é uma exigência para todos que acreditam na importância transformadora da educação.
A produção jornalística tem um papel incontestável nesse debate. Uma sociedade bem informada tem maior capacidade de acompanhar e exigir com mais efetividade uma educação de qualidade.
É função do jornalismo buscar informações confiáveis, debatê-las, além de exercer um controle social sobre políticas e práticas. Essas ações decorrem da escolha de uma agenda de prioridades, que deve ser combinada ao esforço de ampliar as vozes presentes no debate.
Mas o jornalismo tem conseguido isso? A abordagem hoje na imprensa tem colaborado com a qualificação do debate educacional?
É difícil responder assertivamente. Com exceção de veículos especializados, a cobertura sobre educação não se encontra à parte da configuração e disputas que organizam a produção jornalística, guiada, sobretudo, pela temperatura e apelo da notícia. Soma-se a isso um momento de rápida transformação tecnológica no ambiente da comunicação, permeada por uma crise do modelo jornalístico.
Esse contexto não favorece um tema caraterizado pela sua complexidade, como a educação. É, portanto, uma batalha diária impor abordagens sobre educação em meio aos mais diversos acontecimentos.
Por causa da importância e prioridade do assunto, é provável que o espaço reservado à educação sempre parecerá insuficiente. Mas os dados mais recentes sobre a quantidade de reportagens de educação na imprensa mostram que ela não tem sido ignorada. Pelo contrário, ganhou espaço de meados dos anos 1990 para cá.
Temas antes fora do radar, como educação infantil, ganharam destaque e entraram, inclusive, no debate eleitoral dos municípios nos últimos anos. As informações estatísticas de avaliações – que tiveram papel preponderante na elevação do status da educação no noticiário – passaram a ter divulgações mais completas e complexas, o que contribui para uma produção jornalística mais contextual.
As recentes divulgações das informações do Ideb (Índice de Desenvolvimento da Educação Básica) e do Enem (Exame Nacional do Ensino Médio) trouxeram, por exemplo, dados sobre os níveis socioeconômicos das escolas e oferecem leituras mais ricas do que simples ranqueamentos. Entretanto, trabalhar com essas informações no ambiente jornalístico, de velocidade e pressão, requer profissionais especializados.
A tese de doutorado defendida pelo jornalista e pesquisador Rodrigo Ratier na USP em 2015 traz algumas informações relevantes para entendermos a configuração presente hoje na cobertura especializada.
Intitulada “Jornalismo e jornalistas de educação no Brasil: Um olhar multifocal sobre história, estrutura, agentes e sentidos”, o estudo aponta que, dos menos de 100 jornalistas identificados pela pesquisa que trabalham com educação no país, 74% afirmam que a formação universitária não contribuiu para aquisição de conhecimentos sobre o tema.
Além disso, 99% desses profissionais jamais receberam alguma formação para trabalhar com educação. Uma realidade que precisa ser combatida.
As faculdades de jornalismo, por exemplo, têm formado uma quantidade expressiva de jovens jornalistas com interesse em trabalhar com política, economia, esportes e cultura. Mas são poucos os que veem na educação uma carreira.
Falta formação inicial específica na área, o que acaba colaborando com a baixa sedução que o tema provoca. É ainda curioso que, nesse ambiente virtual de novos projetos jornalísticos independentes, são raríssimos aqueles com foco em educação.
Se buscamos um maior protagonismo da sociedade no debate educacional, precisamos avançar. O jornalismo tem obrigação de romper com a preponderância de abordagens situadas entre o catastrofismo e o deslumbramento. A discussão mais madura sobre educação no país passa por uma produção jornalística não só mais presente, mas também que fuja de simplificações.
Uma transformação que não depende apenas de decisões editoriais ou empresariais, mas passa por um movimento amplo de fomento, atenção e responsabilidades.
* Paulo Saldaña é repórter de Educação do jornal Folha de S.Paulo desde março de 2016. Antes, atuou por mais de seis anos no jornal O Estado de S. Paulo, sobretudo na cobertura do tema.