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Quem brinca com fogo se queima – e muitos cientistas que estudaram diferenças de QI entre homens e mulheres se viram envolvidos em palpos de aranha. Em tempos de liberação feminina, igualdade de direitos e de politicamente correto, o tema torna-se ainda mais explosivo. Mas isso não tira o dever de estudar o assunto cientificamente, nem retira dos educadores e especialistas o dever de entender e debater o tema. E, embora os resultados das mulheres sejam diferentes dos resultados dos homens em várias dimensões do QI, as conclusões dos estudos a respeito da diferença de inteligência entre sexos não tem fundamento.
Homens e mulheres variam em inúmeras dimensões, em função de sua constituição biológica. Isso, por sua vez, se reflete em diferenças anatômicas, fisiológicas, funcionais. Peso e tamanho do cérebro são diferentes. Homens e mulheres também diferem nas áreas do cérebro utilizadas para realizar as mesmas funções cognitivas. Não seria surpresa se isso puder gerar diferenças no funcionamento e no desempenho cognitivo.
Historicamente homens e mulheres tiveram diferentes papéis e funções sociais na sociedade, foram e continuam sendo submetidos a práticas culturais e de socialização bastante diferentes – inclusive em termos de expectativas relacionadas ao comportamento escolar e social.
Seria razoável, portanto, esperar que a combinação desses dois fatores, em tese, pudesse criar diferenças na inteligência de homens e mulheres e desempenhos diferentes em testes como os de QI. Mesmo se houvesse diferenças em testes, no entanto, seria extremamente difícil separar o que seria devido a efeitos genéticos do que seria devido a efeitos ambientais.
Há aspectos cognitivos em que efetivamente ocorrem diferenças entre homens e mulheres. Por exemplo, há mais pessoas do sexo masculino com problemas mentais (menos de 70 pontos na escala norte-americana, ou seja, dois desvios padrão abaixo da média). Isso, parece, está associado a uma forte influência genética. Mas nunca se comprovou que existam causas genéticas no caso da maioria dos outros desempenhos cognitivos em que homens e mulheres diferem significativamente nos testes de QI: a maioria das diferenças se explica pelas práticas culturais e acesso maior de meninos a cursos de matemática ou ciências, por exemplo.
Portanto, com base nos conhecimentos disponíveis até o momento, a maioria das diferenças demonstradas em testes entre homens e mulheres se deve essencialmente a fatores ambientais – e não a diferenças nas suas capacidades cognitivas. A capacidade existe e é semelhante – as habilidades nem sempre se manifestam devido à falta de familiaridade, de oportunidades ou a outros fatores.
Em testes de QI, alguns estudos indicam diferenças positivas para as mulheres em habilidades verbais e, para os homens, em habilidades visoespaciais, tais como a rotação de objetos. Mas as diferenças nesses aspectos não afetam o nível médio obtido no fator “G” , que mede a inteligência líquida. Ou seja, as diferenças aparecem quando se usam modelos estatísticos que examinam separadamente fatores como o verbal, perceptivo e visoespacial. Mas mesmo quando essas diferenças aparecem muito cedo e evidenciam uma forte base biológica, como no caso da rotação visual dos objetos, elas podem ser reduzidas a quase zero mediante estratégias de socialização e ensino.
Portanto, até onde a ciência permite esclarecer os fatos, as diferenças que existem em termos anatômicos e fisiológicos, bem como o melhor desempenho em alguns aspectos medidos pelo QI, não significam que os resultados demonstrem diferença de nível intelectual de homens e mulheres. As diferenças de desempenho – que são reais – refletem muito mais as práticas culturais prevalentes.
Sendo assim, a maioria delas podem ser fortemente reduzidas ou eliminadas – a afirmativa vale tanto para as características em que as mulheres demonstram melhor desempenho quanto vice-versa. Isso significa que há um enorme potencial a explorar por meio de práticas culturais e educacionais. E uma imperiosa necessidade de eliminar barreiras e preconceitos – especialmente contra as mulheres.
Na próxima semana…
Um dos fatores mais conhecidos – e mais intrigantes – é o alto grau de relação entre QI e desempenho acadêmico. A relação é tão forte que o desempenho acadêmico muitas vezes serve de substituto à medida do QI. Nos próximos posts vamos tratar desse assunto, a começar pelo mais simples: a relação entre QI e notas em testes que medem o desempenho escolar. |