Nota do Instituto Alfa e Beto:
Este artigo foi publicado originalmente no site Congresso em Foco
A PEC do Teto e a PEC do Ensino Médio, acopladas à crise dos Estados, criam uma oportunidade ímpar para promover um gigantesco avanço nas políticas de ensino médio e formação profissional. O grande avanço da PEC do Ensino Médio é a volta do ensino médio profissional. Mas é preciso mais do que isso para fazer o ensino técnico avançar.
Comecemos pelos dados. Nos países desenvolvidos – com raras exceções, como no caso dos EUA – entre 30 e 70% dos alunos do ensino médio frequentam cursos médios de formação profissional. Em alguns países isso vem aumentando, em outros, reduzindo, mas para patamares nunca inferiores a 50%. A média está acima de 50%.
Esses alunos participam do Pisa – portanto não há razão objetiva para alegar que essa modalidade de ensino não prepara os jovens de maneira adequada. Na maior economia do mundo, os EUA, mais de 85% dos jovens concluem o ensino médio, mas pouco mais de 50% dos alunos iniciam o ensino superior. Ou seja: a economia precisa de pessoas com formação técnica e, mesmo nas economias mais dinâmicas, existe salvação fora da universidade.
No setor produtivo, no Brasil, são menos de 20% os profissionais com algum tipo de qualificação técnica e, atualmente, menos de 8% dos jovens frequentam cursos médios técnicos. Esse é um dos elementos associados à baixa produtividade de nosso país.
Embora prevalente no mundo desenvolvido e consistente com as necessidades das economias mais avançadas, a educação profissional de nível médio encontra fortes resistências no Brasil. Três grupos se opõem à ideia de educação profissional.
De um lado há os que se opõem por razões ideológicas, baseados nas premissas de Gramsci a respeito de uma suposta educação geral e um obscuro conceito de politecnia. Contra ideologias arraigadas não existe argumentação. Parte dessa ideologia alimenta o segundo grupo, que defendem um currículo carregado de disciplinas, argumentado também usado pelos que o fazem apenas em defesa de interesses corporativos.
Um terceiro grupo argumenta tratar-se de uma decisão precoce ou que inviabilizaria o acesso ao ensino superior. O argumento colide com a realidade – pois isso não ocorre nos países mais avançados. Ao contrário, nos países avançados, contingentes expressivos de jovens que não ingressariam no ensino superior pela via acadêmica hoje têm acesso a cursos pós-médios e superiores em suas áreas.
Felizmente, e finalmente, o MEC resolveu enfrentar essas divergências e propôs a volta do ensino médio técnico. Até aqui tudo bem, mas nada disso assegura a expansão da oferta dessa modalidade. E é forte a tendência para amarrar ao máximo as condições de funcionamento da mesma. Mas a porta está entreaberta – agora precisamos escancará-la. A PEC do Teto e a crise dos estados são janelas de oportunidade imperdíveis. Mas, de que oportunidade estamos falando?
De um lado é necessário assegurar recursos para o ensino médio técnico. O caminho mais promissor seria retornar o Sistema S às suas origens, como formador de mão de obra qualificada. O que eram os aprendizes da década de 40 hoje são os técnicos de nível médio.
Bastaria um leve toque na legislação e teríamos à mão quase todos os bilhões de reais necessários para acomodar entre 40 e 50% dos jovens de 15 a 17 anos em instituições de excelente qualidade. O silêncio sepulcral dos empresários e das instituições do Sistema S sobre a Reforma do Ensino Médio – com raríssimas exceções – talvez sinalize a expectativa de um aceno por parte do governo.
De outro lado é necessário assegurar que os estados adquiram condição de sobrevivência e estimulem o ensino médio técnico. Eis a equação: o governo federal negociaria saídas para o problema previdenciário dos estados e municípios. Em contrapartida os estados concluiriam o processo de municipalização do ensino fundamental, previsto na Lei de Diretrizes e Bases e, ao mesmo tempo, abririam espaço e estímulos para o Sistema S e o setor privado cuidarem da formação profissional. Isso reduziria à metade – menos de 4 milhões – o total de alunos para os cursos acadêmicos, que ficariam sob a responsabilidade da rede pública estadual.
Em todo o mundo – e também no Brasil – a sociedade se cansou da política tradicional e dos acertos de gabinete, seja em função de pressões econômicas ou de interesses corporativos. Ainda há tempo para aprimorar a PEC do Ensino Médio. Os governos estaduais estão sufocados e à beira do abismo. O setor produtivo tem meios e competência para dar sua contribuição. Os recursos estão aí, basta redirecioná-los e acabar com desperdícios como o Pronatec. Procura-se um estadista para promover a expansão do ensino técnico na esteira da reforma do ensino médio.
Alguém se habilita?