A deficiência no ensino de matemática no país, um problema crônico da educação brasileira, ficou explícita nas notas do Exame Nacional do Ensino Médio (Enem) 2015 por escolas, divulgado anteontem pelo Ministério da Educação (MEC). A média nacional na disciplina caiu, fazendo com que a diferença entre as médias de 2015 (475) e 2011 (521) chegue a 46 pontos. No mesmo período, segundo um levantamento feito pelo IDados, que é vinculado ao Instituto Alfa e Beto, o Rio de Janeiro foi o estado que teve maior queda na média da prova de matemática, nas redes pública e privada.
No âmbito nacional, a rede pública brasileira tinha nota 478 na prova de matemática do Enem 2011. Em 2015, o número caiu para 440. A nota baixou ainda mais na rede privada, que tinha 586 pontos em 2011 e foi para 531 na última edição.
TENDÊNCIA EM PÚBLICAS E PRIVADAS
No estado do Rio a tendência é parecida. Nas escolas públicas, apesar de registrar um pequeno crescimento de 2014 para 2015, o Rio teve cerca de 63 pontos a menos na prova de matemática da edição do Enem do ano passado em relação ao exame de 2011. As notas foram de 521,8 para 458,5. Na rede privada, a variação foi ainda maior: menos 81 pontos na edição de 2015 quando comparada com a de 2011. Nessas escolas, as médias caíram de 624,7 para 542,9. Todos os outros estados também tiveram variações negativas em relação ao Enem de 2011.
No caso das instituições públicas, a segunda pior variação foi do Rio Grande do Sul, que caiu 61,4 pontos, seguido por Santa Catarina, que teve queda de 57,8 pontos. Em relação às instituições privadas, a segunda maior baixa foi registrada em Santa Catarina, com menos 74,9 pontos na prova de matemática do Enem de 2015 em comparação com 2011. Depois aparece São Paulo, com baixa de 74,2 no mesmo período.
O levantamento mostra ainda que 87,8% dos alunos da rede pública tiraram notas classificadas nos níveis de proficiência 1 e 2, os mais baixos. Na rede privada, essa porcentagem chegou a 55,5% .
Presidente do IDados, Paulo Oliveira afirma que o baixo desempenho dos alunos brasileiros em matemática é uma herança de etapas anteriores do ensino.
— Os maus resultados no ensino médio são em grande parte relacionados ao mau desempenho dos alunos no ensino fundamental. Por mais que a gente fale em reforma do ensino médio, a matéria-prima principal com a qual os professores trabalham é o aluno que vem do fundamental. Se esse estudante chega sem base do fundamental, se não sabe o mínimo, muito pouco pode ser feito no ensino médio para recuperar nove anos de escolaridade falha — argumenta Oliveira.
O desempenho aquém do esperado em matemática também foi visto em outras avaliações. Na última edição do Programa Internacional de Avaliação de Alunos (Pisa), em 2013, apesar de ter conseguido a maior evolução na nota entre os países participantes desde 2003, o Brasil obteve nota 391, bem abaixo da média geral dos outros países (que foi de 494 e oscilou entre as posições 57ª e 60ª) em um ranking que considerou 65 economias globais. O país ainda ficou muito distante de Xangai, na China, melhor colocada no ranking de matemática, com nota 610.
— Se você acha que a escola particular vai bem, já que elas estão melhores que as públicas, está equivocado. No Pisa, por exemplo, vimos que a elite educacional brasileira está num nível que corresponde à média dos países desenvolvidos — analisou Oliveira.
Marcelo Viana, diretor geral do Instituto Nacional de Matemática Pura e Aplicada (Impa), avalia que historicamente o patamar de ensino da disciplina no Brasil é muito ruim. O problema gira em torno da formação deficitária de professores e da imagem ruim que o estudo dos números conquistou na sociedade ao longo de décadas.
— A matemática não é fácil de ensinar e exige do professor vocação e formação que o sistema não oferece. De forma geral, ele é mal formado, não adquire expertise para transmitir conhecimento e a carreira não é atraente. Ao mesmo tempo, existe esse círculo vicioso dos pais dizendo para os filhos que nunca entenderam ou gostaram de matemática. A criança passa a achar que é assim mesmo, que não precisa se preocupar em aprender também. O brasileiro não sabe matemática no nível básico, desde calcular preços no mercado até o juros que ele vai ter que pagar num empréstimo no banco — analisa.
O Impa tem o maior programa de pós-graduação do Brasil e já formou 2.600 mestres em matemática desde 2011, além de promover a Olimpíada Brasileira de Matemática das Escolas Públicas (OBMEP) e Olimpíada Brasileira de Matemática (OBM), voltada para escolas públicas e privadas.
— Esses torneios são uma forma de descobrir talentos. Temos exemplos de alunos que ganham e organizam turmas de estudo com outros colegas para fazer o torneio. É uma competição muito solidária — conta Viana.
Questionado sobre a queda do Rio nos índices, o Secretário Estadual de Educação, Wagner Victer, argumentou que o déficit dos alunos vem do ensino fundamental e reforçou a necessidade de melhorar o ensino da matemática nessa etapa escolar.
— Um dos problemas do ensino médio público é resultado de um ensino fundamental inadequado. Se o aluno tem um resquício de dívida na matemática nessa etapa, isso repercute. Em três anos você não consegue corrigir os déficits de nove anos de fundamental — avalia.