Nota do Instituto Alfa e Beto:
Este artigo foi publicado originalmente no site Brasil Post
Em matéria de gestão de recursos há um consenso: o Brasil gasta mal os recursos da educação. Há menos consenso sobre se gasta pouco – mas essa discussão tem pouco interesse. O fato relevante é que se não gastarmos com eficiência, de nada adianta gastar mais. E há um contrassenso: o país quer gastar mais sem melhorar a qualidade dos gastos.
O leitor quer evidência de que não adianta aumentar os recursos da educação? Nos últimos 10 anos o Brasil dobrou o que gasta com educação básica. Os salários de professores, especialmente nas regiões mais pobres, mais do que quintuplicou. E o aumento da qualidade foi pífio. Portanto, aumentar recursos sem mudar a forma de gastar não irá melhorar a educação. Onde se encontram as ineficiências?
As ineficiências encontram-se na legislação, nas estruturas e na administração. Vejamos alguns exemplos. A ineficiência legislativa começa com a Constituição. Na área do ensino básico, por exemplo, a Constituição é bastante vaga na atribuição de competências entre governo federal, estados e municípios, o que gera uma enorme confusão e superposição. Apenas para dar um exemplo: o governo federal, que nada deveria ter com isso, conversa diretamente com escolas, envia recursos diretamente para elas ou financia propostas feitas por escola sem aprovação da rede de ensino respectiva. E ainda opera uma rede de escolas técnicas de elevado custo e zero de relevância. Outro exemplo: no ensino superior, a Constituição consagra o “princípio” da indissociabilidade de ensino, pesquisa e extensão como norma, o que acarreta vultosos custos e enormes distorções para a oferta desse nível de ensino.
Estruturas inadequadas também criam enormes ineficiências. Uma delas é a estrutura gigantesca do governo federal – que dispensa comentários. Somente o órgão de regulação do ensino superior tem mais funcionários do que muitas universidades. As Secretarias Estaduais e Municipais de Educação possuem estruturas gigantescas. Há Secretarias Estaduais que mantêm delegacias regionais de alto custo e nula relevância – algumas Secretarias chegam a consumir 20% dos recursos da educação no respectivo estado. Secretarias municipais comumente reproduzem o organograma do MEC, que não tem qualquer relevância para operação de escolas. As Secretarias normalmente são povoadas por pessoas com formação pedagógica, sem experiência e domínio das ferramentas básicas de planejamento e gestão. Os livros didáticos disponíveis e as intermináveis “capacitações de professores” são voltadas para um professor e uma realidade que não existe. Isso sem falar nos Conselhos que proliferam em enorme velocidade, e que pouca contribuição trazem para a participação social, transparência e eficiência. Por outro lado temos poucas estruturas e instituições voltadas para as questões centrais da educação – como currículos, formação de professores, avaliação, supervisão escolar, etc.
Além disso há os problemas de administração, incluindo a gestão pedagógica e a gestão administrativo-financeira das secretarias e das escolas. Cerca de 20% dos recursos da educação são desperdiçados anualmente entre alunos repetentes, reprovados e que se evadem. São 30 bilhões de reais que escorrem pelo ralo, a cada ano. A gestão de pessoal é caótica – temos 1,5 de turmas mas contratamos 3 milhões de cargas horárias para cuidar delas. O ano letivo de 800 horas ministradas em 200 dias raramente chega a uma fração disso. O tempo útil de aula situa-se em torno de 60% do previsto. Diretores são escolhidos por critérios políticos ou por eleição, com mandatos curtos e sem a menor chance de formar equipes. Decisões pedagógicas são tomadas com base em critérios corporativistas ou ideológicos, com nenhuma deferência à tradição científica e às evidências. E por aí vai.
Eficiência não é tudo – é apenas um ingrediente. Nas Confissões de Santo Agostinho há uma célebre frase “bene curris sed extra viam” – você corre bem, mas fora do caminho. Em matéria de educação, no Brasil, estamos no pior dos mundos. Corremos mal em termos de eficiência, mas corremos de costas, de olhos vendados, em alta velocidade e na contramão. O desafio adicional é que para mudar de mão precisamos de um mínimo de eficiência. Não dá para misturar dinheiro bom com dinheiro ruim.
O que fazer? O PNE – Plano Nacional da Educação – aprovado em 2014 caminha na direção contrária à racionalidade, aumentando os gastos e a ineficiência. Na falta de sinalização adequada do governo federal, caberá a estados e municípios interessados usarem os espaços que sobram para tentar reverter essa situação. A margem de manobra é pequena, mas existe e precisa ser trilhada.
Alguém se habilita?