Este ano, o ingresso de crianças de 4 e 5 anos anos de idade na Educação Infantil passa a ser obrigatório. A mudança se deve a uma Emenda Constitucional de 2013, que incorporou a etapa ao Ensino Básico, que agora deve durar treze anos. Apesar de o Brasil não estar muito longe de atingir a meta de matrículas nessa faixa etária (temos 87,9 % das crianças de 4 e 5 anos estudando), o país enfrenta um desafio maior que é oferecer qualidade de atendimento a essas crianças.
Pesquisas acadêmicas mostram que o fato de a criança estar matriculada na pré-escola não garante avanços quando o ensino é de baixa qualidade. Pelo contrário, uma pré-escola sem uma proposta curricular que contemple atividades e rotinas apropriadas pode afetar negativamente o desenvolvimento e o futuro escolar dos pequenos.
A organização do tempo constitui um dos maiores desafios para proporcionar à criança cuidados e educação de qualidade. Cada momento da vida na pré-escola deve ser um momento pleno de estímulos, desafios e oportunidades para aprender. Para que isso ocorra, é fundamental planejar bem as atividades de cada dia, no contexto de um plano semanal ou mensal de trabalho. Abaixo, listamos os nove momentos essenciais da rotina da pré-escola. O conteúdo faz parte do Programa Alfa e Beto Pré-escola, do Instituto Alfa e Beto, e leva em consideração as principais evidências científicas sobre aprendizagem na Primeira Infância.
- Chegada e acolhida
Esta é a parte mais importante do dia da criança na pré-escola. Superada a dificuldade na separação dos pais, a criança aprende que é bem-vinda. Quem a recebe, como é recebida pelos adultos, professores e colegas determina o tom do dia e de sua percepção da vida na pré-escola. A chegada também é o momento de formação de importantes hábitos: localizar e guardar objetos, colocar e tirar roupas, amarrar e desamarrar sapatos. A criança deve adquirir autonomia nessas questões logo nas primeiras semanas. A presença de um adulto é fundamental para orientar a formação de hábitos e sequências, bem como para estimular a criança a, progressivamente, tornar-se autônoma.
- Iniciação e rodinha
Há duas formas mais comuns de iniciar o dia: em algumas escolas, a criança se dirige à sala e tem liberdade para fazer o que quer ou pode ficar brincando no pátio, até a organização de alguma atividade; em outras, as crianças já se dirigem diretamente para uma atividade organizada pela professora. Essa atividade pode ser a rodinha habitual, ou algo que a professora preparou para engajar as crianças diretamente nela. O mais usual é a rodinha, e há várias formas e agendas para ela, dentre as quais destacamos:
- Ouvir as crianças, deixá-las contar a respeito de eventos que ocorreram em casa ou no caminho da escola. A escuta é fundamental para o professor identificar crianças que necessitam de atenção especial, e é também um momento profícuo para estimular as crianças que falam pouco e compartilham pouco de suas vidas.
- Fazer a chamada, identificar os presentes e ausentes. Conferir o calendário; aprender sobre dias do ano, mês, semana; falar sobre o tempo; acertar as rotinas do dia; anunciar eventos ou surpresas.
- Introduzir conceitos. Em rodinha, as crianças podem participar de brincadeiras para conhecer o nome dos colegas, falar nome de objetos, identificar palavras ou fonemas, continuar uma história, etc.
- Lanche
A hora do lanche é um momento privilegiado para a formação de hábitos de higiene e saúde, organização, comportamentos sociais e habilidades psicomotoras. Mas é, sobretudo, um tempo privilegiado para uma interação adulto-criança muito semelhante à vida em casa. A possibilidade do professor sentar-se junto às crianças e conversar de maneira livre e descontraída deve ser vista como um momento ímpar.
- Recreio
Numa escola dinâmica em que a criança tem vários graus de liberdade para ir e vir e escolher tarefas e amigos, o recreio não é muito diferente de outros momentos da pré-escola. A existência de espaços e equipamentos adequados e a presença de outros adultos também pode ajudar muito no desenvolvimento de comportamentos sociais. Assegurar a segurança das crianças deve ser uma preocupação básica, e como tudo em segurança, a prevenção é sempre o melhor remédio.
- Repouso
As crianças variam muito em suas necessidades de repouso e na duração dele. As necessidades tendem a se reduzir com o tempo, mas, como qualquer hábito, o repouso deve ser previsto e cultivado. A escola poderá decidir se as crianças que não têm o hábito de dormir devem permanecer quietas descansando ou se podem participar de outras atividades. Ademais, há momentos em que a criança precisa de um tempo e um espaço isolado para se recompor.
- Banheiro/higiene
Há várias questões importantes a respeito desses temas.
- Com relação à higiene. Comprovadamente as mãos são as maiores transmissoras de doenças entre pessoas, e isso é particularmente acentuado no caso das crianças. Portanto, o acesso a locais para lavar as mãos com frequência é fundamental para evitar doenças.
- Com relação ao uso do banheiro. As crianças têm necessidade frequente de ir ao banheiro, mas nem sempre têm a capacidade de prever ou se lembrar. Daí que as necessidades muitas vezes surgem de forma inesperada e com caráter urgente. Ademais, muitas crianças precisam adquirir os hábitos básicos para uso das instalações sanitárias, que nem sempre são ensinados ou praticados em suas casas.
- Tudo isso sugere que pias e banheiros devem ser de tamanho adequado, estar na altura adequada e estar localizados, de preferência, em espaços contíguos ou adjacentes à sala de aula. De outra forma, essa atividade pode consumir 20% ou mais do tempo diário do professor.
- Despedida
A despedida deve ser precedida de uma revisão do dia. Isso ajuda as crianças a desenvolver o sentido de planejamento, previsibilidade e estabilidade. Também ajuda no desenvolvimento da memória e da organização de estruturas narrativas. Antes do encerramento do dia há cuidados a serem levados em conta:
- Arrumação da sala e dos materiais: as crianças devem fazer isso após cada atividade, mas especialmente ao final do dia é importante deixar a sala limpa e arrumada. Isso reforça o senso de planejamento, de ordem e de responsabilidade.
- Arrumação das roupas: esta é outra oportunidade para a criança desenvolver hábitos independentes de se vestir e treinar habilidades motoras. Também ajuda a memória e o senso de responsabilidade sobre os objetos que ela leva e traz para a escola.
- Itens para levar para casa: frequentemente a criança leva para casa mensagens, bilhetes, trabalhos que faz, livros ou objetos emprestados, ajuda também ajuda o processo de memória.
- Dever de casa: se houver dever de casa, o ideal é que isso seja feito de forma sistemática, por exemplo, todos os dias, ou em um dia determinado. Dever passado, deve ser cobrado e cumprido – isso é essencial para a criança desenvolver o senso de responsabilidade.
- Saudações calorosas: são essenciais para constituir e reforçar laços de afetividade das crianças entre si e com os adultos e professores. Além disso, é o momento de interações e troca de informações entre professores e pais.
- Brincadeira livre
Dependendo dos recursos disponíveis, as crianças podem ter tempo para fazer o que quiserem em diferentes espaços da sala. Caso isso seja possível, a professora deve assegurar que as crianças circulem nos vários espaços em dias diferentes, para evitar que sempre façam a mesma coisa. Normalmente, isso se faz formando duplas ou trincas e estimulando as crianças a brincarem juntas. São momentos importantes para as crianças desenvolverem sua individualidade, aprenderem a brincar em grupos de dois, três ou mais; e são momentos preciosos para o professor observar as crianças e engajar-se em conversas reais em torno da atividade que as crianças estão fazendo. Conversa real significa diálogos longos, em que o professor estimula a criança a elaborar seus pensamentos, sentimentos, explicar a ação, etc. É o contrário de fazer questionários com perguntas e respostas ou dar ordens.
- Atividades organizadas
A cada dia o professor organizará duas, três ou quatro atividades, utilizando os materiais disponíveis. As atividades devem ser planejadas de forma espaçada, mas podem ser sequenciais: por exemplo, o professor pode fazer a leitura de uma história infantil e depois fazer uma atividade ou um desenho sobre o texto lido. A preparação para cada atividade deve ser cuidadosa, pois isso facilita a transição e ajuda as crianças a se concentrarem no que irão começar a fazer.
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Para tirar outras dúvidas com relação à rotina e ao planejamento da educação infantil, recomendamos mais duas publicações:
Manual do Gestor da Educação Infantil, que orienta diretores e coordenadores no planejamento e organização de instituições de ensino.
Guia IAB de Educação Infantil, que traz a proposta do Instituto para estimular e promover o desenvolvimento das crianças.