Há vinte anos, crianças em creches e pré-escolas passavam a maior parte de seu tempo brincando: construindo com blocos de montar, criando histórias com bonecos e interagindo com outras crianças em jogos coletivos. Ao longo dos anos, porém, essas atividades foram sendo deixadas de lado para dar lugar a tarefas didáticas características de níveis de ensino mais avançado. O brincar, então, ganhou caráter secundário, sendo tratado como prática de menor valor para o aprendizado.
A ideia, a princípio, parece fazer sentido: quanto mais cedo as crianças se dedicarem às tarefas escolares, melhor será seu aprendizado. O que a ciência comprova, porém, é exatamente o contrário. Um dos muitos estudos que atestam esse fato foi realizado na Universidade do Norte da Flórida, nos Estados Unidos, com crianças de pré-escola. A pesquisa mostrou que aquelas que foram escolarizadas antes dos sete anos de idade tiveram mais dificuldade de aprendizado quando estavam no ensino fundamental do que outras crianças que tiveram mais liberdade para brincar e criar na Educação Infantil.
O que a ciência mostra é que o cérebro das crianças na Primeira Infância – fase que começa no pré-natal e se estende até cerca de seis anos de idade – é muito mais apto a realizar atividades de exploração do que atividades acadêmicas. Segundo David Whitebread, psicólogo da Universidade Cambridge, no Reino Unido, apesar de a brincadeira infantil ser vista por muitos educadores como um comportamento imaturo, ela é essencial para o desenvolvimento intelectual do ser humano. “As crianças precisam aprender a perseverar, a controlar sua atenção e emoções. Elas aprendem tudo isso através do brincar”, disse em entrevista recente ao jornal americano The New York Times.
A criança precisa aprender muito e desde cedo. Mas isso não significa que deva aprender num contexto igual ao contexto escolar. Muito ao contrário. O contexto da escola formal pressupõe algo que as crianças ainda não possuem – o desenvolvimento de habilidades de auto-controle, habilidades interpessoais, capacidade de atenção continuada e especialmente a capacidade de abstração – necessária para absorver os conteúdos típicos de um programa de alfabetização ou para aprender operações matemáticas.
Não significa que a Educação Infantil deva ser apenas um espaço para recreação. O Instituto Alfa e Beto defende que a boa pré-escola é aquela com currículo rico e flexível, com atividades adequadas à faixa etária de 4 e 5 anos e apresentadas às crianças de forma lúdica, pois nessa idade elas aprendem melhor brincando e experimentando. Dessa forma, uma criança pode passar parte importante do seu dia fazendo o que gosta – e a outra parte aprendendo a gostar de participar de outras atividades que são importantes para o seu desenvolvimento.
Nesta semana em que se comemora a Semana Mundial do Brincar, nós reforçamos a importância dessa causa. Nos próximos dias, o Radar da Primeira Infância, iniciativa da qual o Instituto Alfa e Beto faz parte, publicará artigos e pesquisas sobre o tema para ajudar cuidadores, pais e educadores a entenderem como podem incentivar a brincadeira e ajudar o desenvolvimento saudável de seus filhos. O objetivo é mostrar que a pré-escola não é e não deve ser uma escola que vem antes da escola. Educação Infantil é assunto sério, não é brincadeira de criança.
Para saber mais sobre a Primeira Infância, acesse outros artigos do Instituto Alfa e Beto.